Gabriel Marques da Silva
O Pré-crise
Durante o decorrer de 1896 a 1917, período conhecido como a “Era Progressista”, as instituições da política americana passaram por uma das mais importantes transformações governamentais da história, com o surgimento de significativas políticas regulatórias e administrativas. Nessa época, foram incorporadas diversas políticas socioeconômicas marcantes na história dos Estados Unidos, como a criação do Federal Reserve e diversas agências.
Após o estopim da Primeira Guerra Mundial, houve o fim do padrão libra-ouro e, posteriormente, não se chegou a um acordo de qual seria a nova política monetária mundial até Bretton Woods. Assim, os anos de 1914 até 1944 foram anos de desordem monetária, com a inexistência de um país economicamente hegemônico. Para a recuperação estatal, a Inglaterra imprimiu grandes quantidades de dinheiro durante e após a guerra, levando à dominância dos Estados Unidos.
Especulam-se diversos motivos que influenciaram a Grande Depressão, porém o que provocou sumariamente a chegada da Crise de 1929 foi o boom de crédito, feito pelo Federal Reserve System durante os anos de 1920. O livro “A Grande Depressão Americana”, do economista Murray Rothbard, explica:
"O boom é, na verdade, um período de investimento ruinosamente equivocado. É o momento em que os erros são cometidos, por causa da interferência do crédito bancário no livre mercado. A crise chega quando os consumidores vêm restabelecer as proporções que desejam. A depressão é, na verdade, o processo por meio do qual a economia se ajusta após os desperdícios e equívocos do boom, e restabelece o serviço eficiente dos desejos do consumidor. A expansão de crédito bancário principia o ciclo econômico em todas as suas fases: o boom inflacionário, marcado pela expansão da oferta de dinheiro e por mal investimentos; a crise, que chega quando a expansão do crédito termina e os mal investimentos tornam-se evidentes; e a recuperação depressiva, o processo necessário de ajuste por meio do qual a economia retoma as maneiras mais eficientes de satisfazer os desejos dos consumidores."
De forma geral, os principais antecedentes à crise foram a mudança da perspectiva econômica e a Primeira Guerra Mundial, que causou grande déficit orçamentário à Inglaterra, gerando a impressão de moeda e, por conseguinte, a inflação.
O Início da Grande Depressão
A superprodução, muitas vezes colocada como fartura do “American way of life”, era majoritariamente nacional — devido ao protecionismo exacerbado — e, por isso, gerou um efeito bola de neve.
A expectativa de que o governo dos Estados Unidos iria proteger cada vez mais o empreendedor americano também criou um sentimento de que a competição seria “justa”.
Teoricamente, nenhum dono de empresa estrangeira se beneficiaria dentro de setores com vantagens naturais, tendo sua projeção de mercado cada vez menos dominante. Contudo, o aumento de consumo gerado era artificial. Diferentemente da superprodução chinesa, que não gera crise devido ao momento vivido pelo país e às grandes exportações, os Estados Unidos manipulam os juros contra a economia e eventualmente sofre um colapso.
Então, em um cenário em que empresários americanos aproveitaram os juros baixos para tomar cada vez mais créditos que não deveriam, os primeiros sintomas começaram a aparecer. Não apenas o Banco Central americano, como o inglês, criaram um conluio para manipular a taxa de juros, especialmente a de redesconto (juros cobrados pelo Banco Central para efetuar empréstimos a bancos comerciais), controlando a disponibilidade de tal crédito na economia. Portanto, no começo de 1929, o Federal Reserve fecha o crédito, esperando um soft-landing e um ajuste da economia. Contudo, a subida rápida de juros fez com que os empresários devessem mais do que esperavam e setores como bens de consumo e, principalmente, bens de capital, começaram a entrar em crise.
Finalmente, no dia 24 de Outubro de 1929, com uma série de especulações otimistas, a bolsa americana chega ao seu limite e quebra. O que ficou conhecido como “A quinta-feira negra” desencadeou uma série de eventos que levaram o mal ao pior durante os anos seguintes.
Medidas à crise
A influência ideológica da Era Progressista no governo de Herbert Hoover (1929-1933) fez com que houvesse tentativas de controle de preços, principalmente no setor agrário, intervenções estas para evitar maior desemprego e suspensão da criação de moeda buscando um processo deflacionário.
Porém, ao invés de aceitar a crise cíclica, o Estado decidiu intervir ainda mais. O feedback negativo da economia, mostrado na imagem abaixo, foi ainda mais prejudicado.
Feedback negativo do estoque de crédito
Com um aumento acentuado nas taxas de juros, buscando uma correção do erro passado, acabou-se agravando a crise. O impacto na expectativa dos empréstimos tomados pelas empresas gerou uma queda ainda maior da bolsa e o pior ainda estava por vir.
Em 1930, houve um segundo grande choque, causado pela implementação da Tarifa Smoot-Hawley. A mesma diminuiu o volume de importações, fazendo com que os Estados Unidos exportassem a crise para o resto do mundo, que perdia um grande cliente.
A vida extendida da Grande Depressão se deveu muito ao fato de que empreendedores não conseguiam arcar com o salário mínimo que o governo garantia aos trabalhadores, gerando um desemprego em massa e, portanto, um consumo cada vez menor da população. Da forma mais clara possível, se aplicava a lei de Say, a qual estabelece, desde o início do século XIX, que somos capazes de consumir apenas quando conseguirmos produzir algo de valor equivalente com o nosso trabalho.
New Deal
Por fim, entre 1933 e 1939, o presidente Franklin Delano Roosevelt instaurou um conjunto abrangente de programas, políticas e reformas, chamado o New Deal. Apesar do plano não ter terminado a Grande Depressão — papel frequentemente atribuído ao aumento da produção durante a Segunda Guerra Mundial — ele estabilizou a economia e proporcionou alívio a milhões de americanos.
Alguns de seus programas foram:
Agricultural Adjustment Administration (AAA)
Nesse primeiro, foram criados subsídios para a redução da oferta. Ao pagar aos agricultores para reduzir a produção de certos produtos agrícolas (como algodão, milho, trigo e tabaco), os preços aumentaram. Também houve a destruição de excedentes, em que áreas plantadas foram deliberadamente deixadas ociosas.
Works Progress Administration (WPA)
Criar empregos para milhões de americanos desempregados e “melhorar a infraestrutura pública”. Assim se resume a WPA. O programa financiava uma vasta gama de projetos de construção, incluindo estradas, pontes, edifícios públicos, parques e aeroportos que, muitas vezes, não eram da necessidade da população. Contudo, a construção desses espaços serviu como criação de emprego e consequentemente gerou um aumento no consumo. A WPA também empregava artistas, escritores, atores e músicos em projetos culturais, como murais, peças de teatro e escrita de guias turísticos.
Tennessee Valley Authority (TVA)
A TVA tinha como objetivo desenvolver a região do Vale do Tennessee, que era uma das áreas mais pobres e menos desenvolvidas dos Estados Unidos. Através da construção de barragens, usinas hidrelétricas e sistemas de irrigação, foi possível fornecer eletricidade barata e controlar inundações. Além disso, promoveu o desenvolvimento industrial e agrícola da região através de melhorias na infraestrutura e no fornecimento de energia.
Conclusão
Hoje, em uma época na qual a informação é passada de forma rápida, é extremamente difícil que uma crise seja causada pela superprodução. Contudo, governos devem tomar como lição que a independência dos Bancos Centrais na regulação da taxa de juros é de extrema importância. Também deve ficar claro que a impressão de moeda no longo prazo causa mais problemas e apenas resolve superficialmente.
Além disso, é crucial que políticas econômicas sejam baseadas em princípios sólidos e na experiência histórica. A era da Grande Depressão mostrou que intervenções governamentais desenfreadas podem agravar uma crise, enquanto uma abordagem mais equilibrada, com ajustes cuidadosos e estratégicos, pode evitar o prolongamento do sofrimento econômico. Assim, aprender com os erros do passado e aplicar soluções baseadas em evidências são passos fundamentais para garantir uma economia mais resiliente e estável no futuro.
Por fim, é essencial que os líderes políticos e econômicos reconheçam a importância da cooperação internacional e da estabilidade financeira global. A dependência econômica entre os países e os Estados Unidos exige que soluções para crises econômicas sejam desenvolvidas de forma colaborativa, evitando medidas unilaterais que possam desencadear efeitos negativos em escala global.
Bibliografia
Rothbard, Murray. The Progressive Era (2017)
Sistema monetário internacional e globalização financeira nos sessenta anos de Bretton Woods. Arquivado em 22 de dezembro de 2015, no Wayback Machine.. Por Ricardo Dathein. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política. Rio de Janeiro, nº 16, p. 51-73, junho 2005 Acesso em: 23/06/2024
Rothbard, Murray. "A grande depressão americana"
Sobre a crise de 1929 e a Grande Depressão - esclarecendo causa e consequência. Disponível em: <https://mises.org.br/artigos/2375/sobre-a-crise-de-1929-e-a-grande-depressao-esclarecendo-causa-e-consequencia> Acesso em: 23/06/2024
Crise de 1929: Quebra da Bolsa de Nova York completa 90 anos. Disponível em: <https://www.suno.com.br/noticias/crise-de-1929-90-anos/#:~:text=Mas%20foi%20a%20decis%C3%A3o%20do,de%20setembro%20do%20mesmo%20ano.> Acesso em: 23/06/2024
Lei de Say. Disponível em: <https://maisretorno.com/portal/termos/l/lei-de-say> Acesso em: 23/06/2024
Imagem de capa: Disponível em: <history.uol.com.br> Acesso em: 02/09/2024
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