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IA: Entre Otimismo e Volatilidade

Atualizado: 13 de out.

João Pedro de Souza


“How AI Can Change Healthcare For The Better” - Forbes


“Will Artificial Intelligence be Profitable in the Long Run?” - Analytics Insight


“Will Nvidia Be a $10 Trillion Stock by 2029?” - The Motley Fool


Tendências de mercado são como uma montanha russa. O êxtase predomina antes mesmo do carrinho iniciar a escalada. A sede pela adrenalina surge assim que o maquinário dá o aval. Depois, a subida gradativa acompanha a ansiedade de estar no pico dos trilhos e, enfim, desfrutar da sensação de sucesso.


O mercado financeiro não é diferente. Assim que os investidores reconhecem uma inovação com alto potencial de retorno e perenidade, o otimismo sobre o futuro alimenta as teses sobre os investimentos. Essa é a adrenalina predominando. Em seguida, a ansiedade bate na porta quando os ativos atrelados à novidade começam a valorizar de forma acelerada. Assim nascem as tendências de mercado, como foi o caso da internet e do Bitcoin, por exemplo. Nos últimos anos, o mundo e a esfera financeira vêm presenciando o nascimento de uma nova tendência: a inteligência artificial. 


Hoje, o cenário é marcado pelas vastas proporções que as inteligências artificiais (IAs) vêm tomando e podem tomar futuramente. Consequentemente, as companhias mais valiosas do mundo investem em IA e estão cada vez mais adeptas a implementar a tecnologia no modus operandi


Em meio a um contexto de desconfiança no macro e otimismo exacerbado no setor, para onde o percurso dos trilhos leva?


O monólogo do boom


Apesar da sofisticação e complexidade, o tema não é de agora. 


Em 1943, Warren McCulloch e Walter Pitts introduziram, por meio de um artigo, a ideia de uma estrutura de raciocínio matemático semelhante ao sistema nervoso humano. Esse material foi a primeira menção ao conceito de redes neurais. Em 1950, o artigo de Alan Turing trouxe análises filosóficas, computacionais e matemáticas, aprofundando os detalhes diante da capacidade de uma máquina possuir inteligência artificial. Entre a década de 50 até o início da de 70, grandes financiamentos empresariais e governamentais possibilitaram consideráveis avanços científicos essenciais para a pesquisa. Na década de 1990, a IA continuou a crescer e se expandir com a ajuda dos primeiros protótipos de computadores da sexta geração e com o surgimento de técnicas como a mineração de dados e a lógica probabilística. Então, com a chegada do novo milênio, a IA foi impulsionada pelo aumento da capacidade de processamento e armazenamento de dados desses computadores. Novas técnicas, como deep learning e redes neurais convolucionais, permitiram que as máquinas realizassem tarefas mais complexas, como o reconhecimento facial e a condução autônoma de veículos.


Nos últimos 10 anos, a alta demanda por produtividade vem impulsionando o rápido crescimento do setor de IA. As “máquinas pensantes” já estão presentes em muitas áreas, seja para melhorar a eficiência da cadeia de suprimentos, como a Amazon utiliza em seus armazéns, otimizar processos industriais, como a Tesla em suas fábricas, ou aprimorar a segurança cibernética, como as propostas desenvolvidas pela IBM. Até mesmo áreas não vinculadas com tecnologia também estão adotando IA para fins de aprendizagem, atendimento ao cliente, automação de processos e geração de texto, por exemplo. 


A escalada


A OpenAI lançou o ChatGPT em novembro de 2022. O debut marcou a largada para uma “corrida artificial“ no Silicon Valley. Hoje, os gastos superiores a dezenas de bilhões de dólares em tecnologia já não são mais motivo de surpresa, mas de sensatez. 


O lançamento da nova tendência tem uma forte influência sobre a cotação de indústrias e ativos relacionados. Para se ter uma ideia, nos últimos 24 meses, o preço do XLK, ETF que replica a performance dos principais players do setor de tecnologia, cresceu em 23,14%. Além disso, olhando para o micro, no year to date (YTD), ações da Alphabet (GOOGL) cresceram em 17,88%, Microsoft (MSFT) cresceu 12,25%, NVIDIA (NVDA) decolou 179,85%. 


A NVIDIA, inclusive, é uma das principais propulsoras dessa tendência, visto que desenvolve os chips usados para treinar e modelar IA. As ações da empresa têm sido uma espécie de “força maior” no S&P 500. O intenso fluxo do número de ações e receitas crescentes se comportam como um driver do índice. Para se ter uma ideia, operações relacionadas a NVIDIA já chegaram a corresponder a quase 30% de todas as operações da bolsa em determinados dias. 


Dentro do recorte de novembro de 2022 até o momento atual, o market cap da chip maker cresceu cerca de 938%, mesmo com as oscilações recentes. Tesla (TSLA) e CSPs (Content Service Providers), principais clientes do negócio, também tiveram uma alta significativa no market cap, o que também reflete o benefício de investir em IA e justifica a demanda nos últimos dois anos. 


A procura pelos processadores da NVIDIA também influencia o mercado de chips. A Super Micro Computer (SMCI), por exemplo, começou o ano com um preço por ação de US$28,55, subindo para uma cotação próxima de US$118,81 no início de março. No YTD, outras empresas da indústria de semicondutores como a Arm Holdings (ARM), Taiwan Semiconductor (TSMC) e Broadcom (AVGO), valorizaram 119,76%, 87,93% e 67,2%, respectivamente.


Toda montanha russa tem um ponto de inflexão


“... There’ll be another time when people overpay for exciting investment ideas because their future appears limitless, and then a time of disillusionment and price collapse.”


- Howard Marks em “Déjà vu All Over Again”. 


O principal revés de uma inovação marcada pelo otimismo é o cenário em que a realidade não atende às expectativas alavancadas. Assim começa o “sobe e desce” da montanha russa. 


Um dos principais argumentos para considerar uma possível entropia no setor é a proporção custo e receita. Sam Altman, CEO da OpenAI, já citou que a startup tem o maior custo operacional da história. Para se ter uma ideia, o custo de operação diário do ChatGPT é de cerca de US$700.000. Ademais, de acordo com um relatório feito pelo The Information, portal de notícias com foco no setor tech, a OpenAI pode perder US$5 bilhões só esse ano. Uma das causas apontadas foi a desproporção entre o alto valuation e a arrecadação insuficiente. Mas o que acontece se esse alto custo não couber na carteira no médio prazo?


Eventos recentes também denotam as acrobacias na montanha russa e, portanto, a instabilidade no mercado. A primeira semana de agosto foi marcada por uma baixa significativa das ações movida pela incerteza na política monetária e um fraco relatório de empregos nos EUA. Consequentemente, o Dow Jones caiu 1.033,99 pontos e a Nasdaq caiu 3,43%, enquanto o S&P 500 sofreu a maior perda desde setembro de 2022. 


As ações de alto desempenho da Alphabet, Amazon (AMZN), Apple (AAPL) e Tesla caíram mais de 4%, enquanto Microsoft e Meta (META) recuaram cerca de 3%. De acordo com a fornecedora de dados LSEG, os magnificent seven caminhavam para uma perda de US$800 bilhões nos valores de mercado das companhias. Por outro lado, as ações de chips, como a Advanced Micro Devices (AMD), Intel (INTC), Super Micro Computer e Broadcom, também sofreram queda de até 7,8%. Considerando apenas a performance da NVIDIA, a empresa sozinha sofreu um tombo de 7% no fechamento do dia. Apesar de um downsize conjuntural, é perceptível que as ações de companhias diretamente envolvidas com o desenvolvimento de IA reagiram com maior oscilação.


Foto 1: Heatmap do market cap das empresas do S&P durante o dia 05/08

Fonte: Market Screener


No dia 28 de agosto, logo após o fechamento do mercado, a NVIDIA registrou uma receita de mais de US$30 bilhões na divulgação dos resultados do segundo trimestre, US$1,3 bilhões acima das expectativas do mercado e 122% maior que a receita sazonal. É o quarto trimestre seguido que a empresa apresenta uma arrecadação acima de 100%. No entanto, os fortes resultados não foram o suficiente para erguer as ações, que já foram supervalorizadas ao longo do ano e tiveram uma variação negativa de 6,4% no dia seguinte da divulgação trimestral. No entanto, essa queda não foi repentina. As ações já tinham fechado na quarta-feira (28) em um declínio de 2,1%, antes mesmo do anúncio. De acordo com analistas, o delay na produção da nova geração de chips Blackwell é o principal driver que levou Wall Street a uma onda de sell na bolsa.


Ao olhar para o setor de semicondutores, que desempenha um papel fundamental na implementação da IA generativa, os “altos e baixos” são ainda mais evidentes. De 17 de junho a 17 de setembro, um dia antes da queda dos juros nos EUA, a Broadcom recuou 10%, a Taiwan Semiconductor Manufacturing, que fabrica os chips da NVIDIA, regressou 4,76%, e a AMD, concorrente da NVIDIA, desvalorizou 3,51%. Ademais, a mesma Super Micro Computer, que registrou um preço por ação na casa dos 3 dígitos há 7 meses, hoje registra um preço por volta de US$46,47, e analistas alertam sobre o risco de um downsize maior devido às alegações de manipulação contábil e à margem bruta decrescente.


O gráfico abaixo representa a volatilidade rolante mensal, métrica que avalia a volatilidade ao longo de uma série temporal móvel, de um índice dos semicondutores. O benchmark é formado pelas cotações no YTD das 10 empresas mais valiosas do setor ponderadas pelo volume diário das ações. Os dados demonstram uma média geométrica de 5,05% e uma volatilidade rolante elevada em comparação a outros índices.


Gráfico 1: Volatilidade rolante mensal das 10 empresas mais valiosas do setor de semicondutores

Fonte: Investing, Autoral


A métrica de preço sobre lucro (P/L) ilustra dados que evidenciam a disparidade e a proporção gasto e retorno no setor. Das 5 companhias com maior market cap da área, todas apresentam um múltiplo superior à 22,07, média do setor.


Gráfico 2: Preço sobre Lucro das 5 principais empresas do setor de semicondutores

Fonte: Finance Charts


De encontro à “maré de azar”, a primeira semana de outubro representou mais uma escalada na montanha russa. O corte da taxa de juros americana reacendeu as esperanças dos compradores. Outro combustível foi a histórica rodada de captação promovida pela OpenAI, que impulsionou o valor da empresa para US$157 bilhões e contou com investimentos da Thrive Capital, Microsoft e NVIDIA. A AMD, por sua vez, anunciou na última semana o The Instinct M1325X, chip que começará a ser desenvolvido pela empresa em dezembro deste ano e promete intensificar a competitividade entre os players. Além disso, a Microsoft lançou recentemente uma série de novas ferramentas de inteligência artificial e dados voltadas para o setor de saúde, visando à automação e produtividade. 


Será a hora da serenidade prevalecer depois de toda a adrenalina?


Conclusão


“Given the focus and architecture of generative AI technology today… truly transformative changes won’t happen quickly and few, if any, will likely occur within the next 10 years.”


- Daron Acemoglu


Além de contábil, o mercado financeiro é um ambiente comportamental. Quando a montanha russa segue a inclinação positiva, se direcionando lentamente a um topo, todo mundo fica feliz. Porém, no momento em que começam as quedas, quem aguenta o caos sem entrar em pânico? 


A oscilação recente parece mais um motivo para ficar alerta do que uma oportunidade. De fato,  o cenário macroeconômico dos Estados Unidos, marcado por uma persistência inflacionária e desconfiança monetária, certamente influenciou o comportamento da bolsa nos últimos meses. Da mesma forma que, agora que as perspectivas parecem mais claras, a confiança retorna lentamente. Apesar disso, as significativas perdas operacionais e altos gastos dos players indicam que o micro não está imune ao ceticismo e à incerteza.


É inegável o potencial imensurável da inteligência artificial e o impacto sobre o mundo financeiro. No entanto, é necessário entender o que é a tecnologia hoje. Afinal, investir em IA com o argumento de “acho que vai dar certo”, sem saber onde dará certo, não é uma tese de investimento. Transformações em grande escala não vão acontecer de um ano para o outro e a indefinição do percurso dos trilhos deve ser um determinante para manter os pés no chão. A inteligência artificial não é a tecnologia da fé, mas da paciência.


Bibliografia



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Nvidia’s market cap has plunged by US$406 billion. Is the AI bubble about to burst? Disponível em: Nvidia shed US$406 billion this week, is the AI bubble bursting? (vulcanpost.com)


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Is This Artificial Intelligence (AI) Stock a Bargain After Recent Volatility? Disponível em: https://www.fool.com/investing/2024/09/11/is-this-artificial-intelligence-ai-stock-a-bargain/


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Nvidia Earnings Stock Market Today 08-28-24. Disponível: https://www.wsj.com/livecoverage/nvidia-earnings-stock-market-today-08-28-2024


NVDA Shares Fall After Earnings Beat Estimates. Disponível em: https://www.cnbc.com/2024/08/29/nvidia-nvda-shares-fall-after-earnings-beat-estimates.html


Nvidia Stock Drops. Why Strong Earnings Weren't Enough to Lift Shares. Disponível em:


Nvidia reports 122% revenue growth on surging demand for data center chips. Disponível em:


NVIDIA sees stock prices drop after record Q2 earnings. Here’s why. Disponível em: Nvidia sees stock prices drop after record Q2 earnings. Here's why. (usatoday.com)


Super Micro shares tumble 12% after DOJ reportedly opens probe into company. Disponível em: https://www.cnbc.com/2024/09/26/super-micro-shares-tumble-12percent-after-doj-reportedly-opens-probe-into-company.html

AI bubble or 'revolution'? OpenAI's big payday fuels debate. Disponível em:


OpenAI passa a valer US$157 bi após obter US$6,6 bi em nova rodada de investimentos. Disponível em: OpenAI passa a valer US$ 157 bi após obter US$ 6,6 bi em nova rodada de investimentos (globo.com)


AMD lança chip de IA para concorrer com a Nvidia. Disponível em: AMD lança chip de IA para concorrer com a Nvidia | Exame


Microsoft Announces New AI Tools For Healthcare. Disponível: Microsoft Announces New AI Tools For Healthcare - TechBullion


Foto da capa: designed by Freepik

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